Este é um espaço predominantemente pessoal e familiar, mas não se limita a esta categoria. Tem como proposta fundamental apresentar pensamentos, relatar experiências, propor discussões, criar novas amizades e consolidar as já existentes.

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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Cursando Biologia, e daí ?

A silenciosa batalha de nervos com seus encantos e desencantos possibilita que a angustia vivenciada em quatro horas durante a execução da prova, represente anos de renúncias e expectativas. Ao sair o listão, os bairros de Belém assistem a outra batalha, desta vez não nas salas dos cursos pré-universitários, mas nas ruas.
Em meio a projeteis de ovos, maizena e tinta, a azáfama dos aprovados delineia a paisagem: uns correm, outros choram, berram, pulam, se abraçam ou simplesmente estatelam-se em frente ao rádio, contorcendo-se ante a narrativa emocionada dos locutores das emissoras locais. Atendemos incrédulos às congratulações que chegam pelo telefone, pois é neste momento, que parentes e amigos surgem a todo instante, justamente na hora do sufoco psicológico. Carros desfilam pelas ruas rumo aos colégios e cursinhos - pontos estratégicos da fuzarca.
Uma vez confirmado o nome no listão, saboreamos imenso e singular prazer ao desfrutamos duas grandes alegrias: a realização do sonho de nos tornarmos universitários e, a satisfação nitidamente estampada no semblante de nossos familiares e amigo. De certo, finalmente chega o momento de gozar do "status" de universitário. Não raro nas esquinas da Tropicalíssima, cabeças femininas exibem tonalidades multicoloridas fazendo páreo à brilhantes carecas cheias de orgulho e sublimação, contagiando até aos mais precavidos ao som do regionalíssimo "Alô, alô, alô papai, alô mamãe..."
Contudo, diante da propalada exigência competitiva de uma sociedade globalizada em que o mercado de trabalho tende, cada vez mais, a absorver mão de obra especializada, a façanha de ter atravessado o funil do curso superior massageia as esperanças de um futuro promissor. 
Não obstante, a saga acadêmica está apenas começando. Durante algum tempo, inebriados pela sensação de alívio reconfortante ao ter alcançado o objetivo, maior do estudante do ensino médio, descansamos nossa mente dos alfarrábios secundarista, sonhando com a habilitação e a matrícula universitária. Agora tudo será diferente, pensamos! Permanecemos perseverantes e otimistas na certeza de que iremos realizar, a partir de então, o que ninguém nunca realizou, convictos de que somos senhores de nosso destino. Ledo engano! Não é preciso mais que dois meses para que as primeiras decepções saltem aos olhos. Talvez devido a nossa prepotência de jovens calouros vitimados por ilusões de um sistema educacional falho e deficiente.
Ao cabo de alguns meses, a ansiedade e o orgulho inicial, dão lugar a uma desconcertante sensação de obliteração e, quando muito, restando reles vestígios da emoção inicial. A válvula das desilusões abre-se exatamente quando diante de nós, irrompe-se uma realidade escrita com letras garrafais: "greve geral na universidade pública".
Assim, desmancham-se intrepidamente as promessas fantásticas do paraíso universitário, outrora, recheado de possibilidades profissionais. Percebemos finalmente, no alto das sapatas acadêmicas, que nossa verdadeira conquista não foi a “glamourosa” entrada no campus da UFPA - temperada a ovos, maizena e tinta, - mas tão-somente sua rápida, discreta e eficiente saída.
Lutamos para nos formar no tempo mínimo de integralização curricular. Desejamos realizar cursos, ganhar bolsas de estudo, participar de eventos acadêmicos, ter boas aulas, professores dedicados e, finalmente, percebemos que a experiência na universidade jamais se dissociará ao contínuo esforço em driblar as dificuldades, sejam interiores ou exteriores. Crescemos no exercício honesto de caminhar com as próprias pernas. Nesta batalha pela sobrevivência acadêmica, vamos enfrentando as competições presentes na formalidade burocrática do sistema ou na informalidade dos círculos de "amizades".
Obviamente nem todos sobrevivem, muitos se informam mais poucos se formam e, neste cenário de estudantes desiludidos, presenciamos alguns calouros se refugiarem no curso de segunda opção, simplesmente por não disporem de coragem suficiente para continuarem tentando a aprovação no curso em que realmente pretendiam, em geral os cursos mais concorridos. E em sendo assim, aproveito para compartilhar minha experiência pessoal com os futuros colegas de profissão.
Sabemos que inexiste uma fórmula para o sucesso acadêmico e profissional, entretanto, a experiência indica-nos que dispomos de muitas possibilidades para superar os percalços da profissão e o caminho mais sensato está na audácia em preservar a vivacidade da emoção inicial advinda do momento do vestibular.
A realização de uma graduação tranqüila e sem atropelos requer algumas atitudes as quais não constam no manual do calouro. Durante a graduação será comum não dispormos de tempo suficiente para a dedicação integral às atividades acadêmicas, mas é fundamental a disposição em buscá-lo incessantemente. 
       Aos legítimos calouros de Biologia, convém evitar trancamentos e reprovações em disciplinas. Não construa uma carreira com bravatas e cotoveladas; seja colaborativo e altruísta no convívio acadêmico. Informe-se permanentemente sobre estágios e oportunidades de trabalho, a fim de escrever o quanto antes, um currículum vitae participativo em eventos específicos na sua área de interesse.
É importante o conhecimento básico de línguas estrangeiras, Inglês principalmente, faça cursos livres, leia, escreva, pratique o cotidiano da pesquisa. A rotina redacional e o conhecimento de informática são outras exigências imprescindíveis à boa formação. Não espere para chegar no terceiro ou quarto ano do curso, para realizar estágios em ensino e pesquisa. Bolsas de estudo são regalias restritas mas, disponíveis a quem se planeja desde cedo a conquistá-las. Tive sorte de trilhar os caminhos da Biologia com amor e sem nunca ter perdido a fé e o brilho da emoção inicial. Quem sabe aqui estejam alguns ingredientes para se alcançar uma formação sólida e consistente em Ciências Biológicas e quiça um sucesso profissional.
                 


       Publicado no caderno Opinião de O Liberal em 28 de janeiro de 2000



Um comentário:

  1. Este foi meu primeiro texto. Fazia apenas alguns dias da conclusão de meu TCC e o estresse cedia lugar a ansiedade da cerimônia de colação de grau que se aproximava. Eu tinha a honrada missão de representar meus amigos como orador das turmas de licenciatura plena e bacharelado em Ciências Biológicas da UFPA. Na mesma época também havia a expectativa da UFPA liberar o “listão” com os nomes dos aprovados no vestibular daquele ano. Lembro-me que escrevia este texto com a mesma emoção e sinceridade com que escrevi o discurso de colação de grau com o único objetivo de retribuir a gentileza concedida por aqueles amigos e amigas que me acompanharam naquela aventura acadêmica e dividir um pouquinho dessa incrível experiência com os aspirantes e futuros calouros do curso de Biologia.

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