Este é um espaço predominantemente pessoal e familiar, mas não se limita a esta categoria. Tem como proposta fundamental apresentar pensamentos, relatar experiências, propor discussões, criar novas amizades e consolidar as já existentes.

Pesquisar este blog

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Invenção de anjos ou demônios?

A Imunologia é uma invenção do demônio.” Esta frase curiosamente escrita no prefácio de um livro de Imunologia, ilustra a opinião bem humorada de seus autores,  especialistas no assunto. Ela revela a angustia que estes experts possuem para manter o heróico esforço de se atualizarem nesse campo tão especializado do conhecimento humano, o qual se expande demoníacamente.
De certo modo a Imunologia é a ciência que trata da criação e aplicação de meios que possibilitem um estado de imunidade no organismo hospedeiro, protegendo-o de certos tipos de doenças. Esse estado de imunidade pode ser induzido através de vários tipos de vacinas, muitas destas disponíveis comercialmente.
Tudo começou em 1796 quando o médico inglês Edward Jenner descobriu a primeira vacina da história, imunizando um garoto de oito anos contra varíola. Em latim a palavra vaca escreve-se “vacca”, e da mesma forma varíola bovina escreve-se “vaccinia”, desse modo, Jenner empregou pela primeira vez o termo vacinação para descrever o processo de inoculação da varíola bovina, para conseguir imunidade contra a varíola humana, fundando dessa forma a ciência da Imunologia. De lá para cá muita coisa mudou, porém, o princípio fundamental para se atingir o estado de imunidade ainda é basicamente o mesmo.
De um modo simplificado, a produção de vacinas se baseia na utilização de microorganismos vivos atenuados, microorganismos vivos inativos ou extratos processados a partir de componentes destes microorganismos, os quais podem estimular duas faces da resposta imune, caracterizadas pela formação de anticorpos (resposta humoral) e pela imunidade ligada as células (resposta celular). Entretanto, uma longa série de descobertas ocorridas nas últimas décadas, nos permitiu entender com mais clareza os fenômenos imunológicos, aperfeiçoando a produção de vacinas e soros.
Existe atualmente um estágio experimental na produção de vacinas a base de peptídios e a promessa de tão desejada vacina de DNA. Esta última, deve revolucionar o campo da Imunologia, pois apresenta uma série de vantagens econômicas, técnicas e logísticas, a começar pela sua produção, que é bem mais barata. Além disso, a manutenção do controle de qualidade é mais fácil e, sua comercialização não necessita de uma rede de refrigeração, pois essas vacinas, a rigor, são estáveis a temperatura ambiente.
Obviamente que estes fatores facilitam o transporte e a distribuição destas vacinas, viabilizando a transferência de tecnologia aos países em transição econômica, a exemplo do  Brasil. Somado a isso, as vacinas de DNA fornecem a informação genética necessária para que o organismo possa fabricar os antígenos necessários a indução da proteção desejada, estado que pode durar pelo resto da vida e sem o risco do organismo desenvolver as temerosas reações alérgicas, as quais constituem atualmente, um problema insuperável nas vacinas clássicas disponíveis.
Mas nem tudo são flores. Como possíveis desvantagens podem ser citadas a possibilidade de conseqüências desastrosas como a ativação de protooncogens - gens responsáveis pelo aparecimento de tumores (câncer), - ou a inativação de gens supressores de tumores, ou seja, os "gens mocinhos", aqueles que evitam o surgimento dos tumores. Como se não bastasse, pode ocorrer ainda a tolerância farmacológica. Contudo, nenhuma evidência desses fenômenos foi comprovada. Até o presente momento, testes rigorosos estão sendo feitos em modelos experimentais em diversos laboratórios pelo mundo e, em breve, estarão realizando testes em seres humanos. Mas antes que isso ocorra, esperamos que a Imunologia tenha se redimido do seu estatus demoníaco, sobretudo, entre os estudantes dos cursos básicos, e consiga atingir o adequado e providencial nível de ciência celestial.

Publicado em O Liberal, 02 de dezembro de 2005.

Nenhum comentário:

Postar um comentário